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Relato e reflexões sobre a reunião SBPC/Sociedades Científicas e Governo O futuro da ciência brasileira?


No dia 11 de março de 2020, ocorreu, na cidade de São Paulo, a reunião da diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), com a presença de mais de 70 associações científicas filiadas, do presidente da CAPES, Benedito Guimarães Aguiar Neto, do presidente do CNPq, João Luiz Filgueiras de Azevedo, e os representantes da FINEP e do Ministério Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). O objetivo desse encontro foi discutir com o governo a preocupante conjuntura e o futuro próximo da ciência brasileira.

Dividiremos o relato e as reflexões a partir das intervenções dos gestores do governo, dispostas na seguinte sequência: Capes, CNPq, Finep e MCTIC. Antes, porém, como introdução, informamos que o tema dos cortes no orçamento dominou as exposições. O que se viu foi, de forma mais próxima e intimista - quando comparado a portarias do governo ou notícias que nos chegam pela mídia - o anúncio pelos próprios gestores, cara a cara, da decomposição orçamentária que vem destruindo a ciência brasileira. Os cortes atuais, os futuros cortes e as imprecisões orçamentárias são uma realidade explícita e sem volta no atual governo federal, realidade aceita e até mesmo defendida por alguns desses gestores, como no caso do presidente da Capes (discurso em total consonância com o Ministério da Educação). Os gráficos de orçamento apresentados mostram um declínio exponencial dos recursos para a ciência. Interessante é que esses gráficos sempre datam de 2015 até 2019/20, todos eles mostrando curvas descendentes. Entretanto, se ampliássemos o período dos dados, desde 2005, por exemplo, as linhas ou colunas representativas mostrariam não um orçamento em redução, mas, sim, em queda livre.

CAPES

Na apresentação do presidente da Capes, assistimos a um discurso muito próximo da narrativa bolsonarista. No preâmbulo inicial da sua fala, além de atacar a imprensa nacional, ele introduziu a noção de que o importante é investir na educação básica. Embora a Capes tenha projetos nessa área, introduzir uma exposição sobre a conjuntura e o futuro da ciência brasileira a partir dessa interpretação (afinal estávamos ali para discutir a produção de conhecimento no âmbito universitário), deixou-o muito próximo das opiniões do presidente da república, logo no início do seu mandato. Bolsonaro usou a narrativa de que a educação básica e as crianças deveriam ser o foco das políticas educacionais do seu governo como um abre alas para começar toda a sorte de ataques às ciências, aos cientistas e as Universidades brasileiras.

A respeito do orçamento, o presidente afirmou que se pode fazer mais com o mesmo e não com menos, porém que os cortes estavam feitos e que o trabalho deve ser realizado a partir da conjuntura dada. Com isso, a Capes passará a fazer a distribuição dos recursos, sobretudo das bolsas de pesquisa, levando em consideração o mérito e assimetrias. O tema das áreas estratégicas e prioritárias também apareceu na sua fala. Nesse ponto, valem algumas considerações.

O presidente da Capes reuniu-se com mais de 70 associações científicas e com a diretoria da SBPC já com a Portaria 34 em mãos, mas não nos informou que ela seria publicada. Não nos informou, porque se tratava de um golpe e de uma traição às discussões e acordos travados com o Fórum dos Pró-Reitores de Pós-Graduação (FOPROP) e com os dirigentes das instituições de ensino superior (Andifes), como já sedimentado nas Portarias anteriores sobre o mesmo tema. Não é por menos que nas várias manifestações e notas após a publicação da Portaria no Diário Oficial da União, no dia 18 de março de 2020, uma série de palavras ilustram o sentimento de golpe: “perplexidade”, “quebra de confiança”, “repúdio”, “surpresa”, “consternação”, “incredulidade”, “preocupação”, etc. Logo depois da publicação, descobre-se que nem o Conselho Superior da própria Capes foi consultado. Portanto houve uma traição clara ao que vinha sendo discutido com os representantes das Universidades, e um evidente golpismo ao Conselho Superior da própria coordenação, sendo que não nos informar sobre a portaria já redigida (datada de 9 de março, publicada no dia 18 do mesmo mês), em um raro encontro que reuniu boa parte da representação científica nacional, é apenas um detalhe na arquitetura de destruição da pesquisa nesse País.

E, como sabemos, para dar golpes deve-se ter coragem, essa coragem aparece no ofício nº 7 de 2020 da Capes, veiculado no mesmo dia de publicação da Portaria 34. No início do ofício encontra-se: “Consoante orientação central do Ministério da Educação (MEC) e considerando a alta receptividade do modelo de redistribuição de bolsas publicado no final de fevereiro deste ano, foi identificada a conveniência de ampliar a velocidade de sua implantação, privilegiando com maior vigor os cursos mais bem avaliados”. Mesmo que Portarias anteriores tenham passado por discussões com representantes das Universidades, não há nenhuma possibilidade de considerar que as propostas de distribuição de bolsas pela Capes, desde a posse do Governo Bolsonaro, tenha tido alta receptividade, muito pelo contrário, há uma imensidão de críticas às políticas de ciência desse governo, no qual a distribuição de bolsas é uma delas.

Uma observação válida é de que há um jogo de portarias que confunde e deixa complexo o acompanhamento da política de ciência no Brasil. Constrói-se uma espécie de beliche de portarias em que uma assume ou subssume-se à outra, uma emenda a outra ou apenas altera artigos da outra, causando insegurança tremenda aos gestores das universidades e aos pesquisadores. Um pouco antes da publicação da Portaria 34/2020 já estavam em vigência as Portarias 18/2020, 19/2020, 20/2020 e 21/2020, que normatizam o mesmo tema. A Portaria 34 alterou essas portarias recentes e a Portaria 150/2019.

Do que trata a Portaria 34/2020/Capes? Trata do pobre e perverso discurso de meritocracia que aparece na fala do presidente da Capes em reunião na sede da SBPC. Dotada de uma lógica matemática, a nova distribuição de bolsas de pesquisa no País atinge negativamente todas a universidades, Programas, grupos e laboratórios de pesquisa. Porém, os menos lesados (atacados) serão aqueles que possuem mérito a partir da avaliação da Capes. A nova normativa determina que as bolsas serão distribuídas, em forma decrescente, dos Programas de Pós-Graduação de melhores notas para os Programas com menores notas (a nota de um Programa de Pós-Graduação varia de 7 a 3), sendo que os cortes procederão de forma inversa, os programas piores avaliados sofrerão mais cortes. Assim, os melhores Programas recebem mais, porém com a possibilidade de sofrer cortes e os Programas piores recebem menos e com a certeza de cortes. É uma espécie de distribuição que parece estar baseada no sistema tributário brasileiro, os pobres pagam mais que os ricos, um Robin Wood ao contrário. Vejamos a lógica como publicada na Portaria:

I - diminuição não superior a 50% (cinquenta por cento), para cursos cujas duas últimas notas forem iguais a 3 (três), vedado qualquer acréscimo;

II - diminuição não superior a 45% (quarenta e cinco por cento), para cursos cuja nota atual for igual a 3, vedado qualquer acréscimo;

III - diminuição não superior a 40% (quarenta por cento) ou acréscimo limitado a 10% (dez por cento), para cursos cuja nota atual for igual a 4;

IV - diminuição não superior 35% (trinta e cinco por cento) ou acréscimo limitado a 30% (trinta por cento), para cursos cuja nota atual for igual a 5; ou

V - diminuição ou acréscimo a 10% (dez por cento), para cursos de nota A ou de nota 3 ainda não submetidos a processo de avaliação de permanência;

VI - diminuição superior a 30% (trinta por cento) ou acréscimo a 70% (setenta por cento), para cursos cuja nota atual for igual a 6; ou

VII - diminuição não superior 20% (vinte por cento), para cursos cuja nota atual for igual a 7, sem limitação de teto.

Ou seja, aqueles Programas de Pós-Graduação que precisam de mais apoio são os que menos receberão, é uma espécie de Casadinho às avessas. No passado não muito distante, houve políticas de apoio aos Programas com baixa nota na avaliação da Capes (Programas 3 e 4), como foi o caso do Casadinho/Procad. Hoje, o objetivo é penalizar os Programas notas 3 e 4 e não ajudá-los. A nova normativa informa que os Programas nota 3 em três avaliações consecutivas da Capes “não são mais passíveis de fomento”, o que vai significar o fechamento dos Programas nessa condição.

Muitas manifestações da comunidade científica circularam nas redes sociais e na mídia contra os cortes anunciados na Portaria 34, o que fez a Capes publicar, no dia 23 de março de 2020, esclarecimentos sobre o modelo de concessão de bolsas. Trata-se de uma espécie de fake news da gestão da ciência brasileira. Encontra na publicação:

Como parte do esforço para a alocação de bolsas de mestrado e doutorado de forma equânime para todos os cursos de pós-graduação stricto sensu, a CAPES publicou as portarias 1820 e 21, em fevereiro deste ano, por meio de modelo inédito de distribuição de bolsas.

Não foi feito corte algum, muito pelo contrário. Em fevereiro de 2020, quando a CAPES anunciou o modelo de concessão de bolsas, havia ao todo 81.400 bolsas no País, distribuídas por mais de 350 instituições de ensino superior – públicas e privadas – que abrangiam mais de 7 mil cursos. Um mês depois, em março, com a implementação do modelo, este número passou para 84.786 benefícios para mestrado e doutorado. O aumento foi necessário para atender os cursos mais bem avaliados.

Não houve cortes. A rigor, a parcela de bolsas que deixa um curso de menor qualidade passa para cursos com melhores indicadores.

Em primeiro lugar, pelo beliche complexo de sucessivas Portarias sobre o mesmo tema apresentadas pela Capes, é impossível vislumbrar a alocação “equânime” de bolsas entre os Programas de Pós-Graduação no Brasil! Em segundo lugar, como a Capes não publica de forma clara os dados da distribuição das bolsas pelo País, mostrando como era em 2019 e como é atualmente, o que sabemos, de forma fragmentada, mas orquestradas, é que reitores, pró-reitores e coordenadores de Programas estão se manifestando contra os cortes de bolsas. O que leva a crer que a Capes produziu fake news, acompanhada por tuitadas do inadjetivável ministro da educação. Em terceiro lugar, parece ser falso que houve uma alocação de bolsas dos Programas piores para os melhores avaliados, a começar pelo próprio modelo apresentado na Portaria 34, na qual todo os incisos iniciam a redação com a palavra “diminuição”, mas, principalmente, por não ter circulado nas redes sociais ou na mídia, uma universidade ou um Programa festejando aumentos significativos no número de bolsas. O que circulou é que até programas com nota 7 também perderam bolsas. Por exemplo, os programas de pós-graduação em Antropologia mais bem avaliados do país, com notas entre 6 e 7, perderam 7,4% das bolsas de mestrado e 14,44% das bolsas de doutorado, objetivando uma inverdade sobre o direcionamento de bolsas para os cursos melhores avaliados.

Não custa repetir: porque a Capes não publica a totalidade dos dados em uma série histórica que permita comparações? Nos mostre em uma simples tabela de dados a totalidade de bolsas por universidade, centro de pesquisa e programas! Publique no site da Capes a totalidade das bolsas, indicando quem perdeu e quem ganhou, de onde era e para onde foi o recurso. Disponibilize a todos os coordenadores de área da Capes os dados por área e indique que eles comuniquem a todos os Programas os quais representa. Faça isso e pare com a guerra de informações!

É por esse obscurantismo da Capes que a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) lançou uma campanha para monitoramento dos cortes dessas bolsas normatizadas pela Portaria 34. A tarefa é compilar dados, escondidos e não divulgados pela Capes, diretamente e a partir dos Programas de Pós-Graduação. Caberá aos coordenadores de pós-graduação informar os cortes em plataforma lançada pela ANPG (https://bit.ly/MonitoramentodocortedeBolsasPortaria34). Mesmo que provavelmente essa iniciativa não deva chegar a totalidade das bolsas distribuídas e aos cortes, pode construir a base de dados mais objetiva para mostrar que a ciência brasileira está sob ataque e que o presidente da Capes e o Ministro da Educação produzem uma guerra de informações publicando e informando mentiras.

Por fim, retornando ao dia da reunião, além de não nos informar do que estava por vir, o presidente da Capes fez uma apresentação generalista e fragmentada, cheia de imprecisões e achismos (principalmente sobre seu entendimento do que é interdisciplinaridade), e, devido a sucessivos telefonemas que ele teve que atender durante sua exposição, praticamente não houve debate e esclarecimentos.


 


 

CNPq

A apresentação do presidente do CNPq girou sobre dois pontos: os cortes no orçamento e as saídas via mercado. Também foi anunciada a mudança na forma de distribuição de bolsas.

Direta e clara, a fala do gestor do CNPq anunciou um provável calote nos pesquisadores que possuem projetos já aprovados e em andamento e a muito provável não abertura de Edital Universal 2020. Em suma, a paralisação de uma parte significativa das pesquisas financiadas pelo CNPq no Brasil.

Na concepção da atual gestão desse órgão, a saída ao “contingenciamento” de recursos deve vir via mercado. Muito afinado com as posições da FINEP, o CNPq direciona o futuro do financiamento da pesquisa científica nacional para o mercado, com o mercado e pelo mercado. Interessante que em nenhum momento faz-se uma avaliação da estrondosa crise da economia brasileira. A crise é utilizada para justificar o corte no orçamento, mas é esquecida e escondida no momento em que tais propostas são elaboradas. Vale lembrar que o tal mercado está em crise profunda bem antes de sermos acometidos pelos coronavírus e, certamente, alcançará limites trágicos após o controle da pandemia, isso nos leva a pensar que em hipótese alguma deve-se atribuir ao mercado a função de financiador do desenvolvimento científico. Sem contar que não é tradição do empresariado nacional financiar pesquisas, como pode ocorrer em outros países. Imaginem as ciências que pesquisam o rural brasileiro dependerem do pujante setor do agronegócio, setor tradicionalmente parasitário dos recursos públicos?

Conjugado à proposta do mercado como fiador da ciência, na fala do presidente do CNPq, a expressão áreas estratégicas foi recorrente (o que o presidente da Capes chamou algumas vezes de áreas prioritárias). É evidente que as áreas estratégicas são as áreas aliadas ao mercado, com o objetivo de produzir uma ciência e cientistas empreendedores, com uma produção de conhecimento que dê lucro. Quando perguntado, na reunião, onde entraria as ciências humanas nesse rol de áreas prioritárias, o presidente do CNPq respondeu com a seguinte situação hipotética: vamos supor que esteja aberto um edital de pesquisa para o setor de aeronáutica, caberia a um psicólogo, por exemplo, submeter uma proposta de pesquisa para investigar o comportamento de passageiros e tripulação. Resposta improvisada que não se sustentaria se fosse questionado sobre como fica a vida de quem pesquisa, por exemplo, filosofia pré-socrática, historiadores do período do golpe militar brasileiro, literatura negra no Brasil, sociólogos e cientistas políticos que pesquisam partidos políticos, geógrafos que estudam o movimento sem terra...?

Com isso, ele afirmou claramente que não existirá edital de pesquisa para as Ciências Humanas. Um duro golpe em uma área substancial para o desenvolvimento de um país fundado, historicamente, em desigualdades sociais e econômicas (inclusive, as ciências humanas podem ser fundamental na produção do conhecimento sobre os impactos da pandemia do coronavírus).

Ainda sobre o financiamento da ciência via mercado, apareceu na exposição de propostas do CNPq o seguinte: Estamos trabalhando para construir alternativas inovadoras para geração de novas fontes de financiamento da CT&I: “endowment funds” e uso de fundações de apoio, por exemplo”. Isto quer dizer que esse órgão vê como possibilidade a dependência de captação de recursos para ser investidos no mercado financeiro como forma de financiamentos da pesquisa. Explicamos melhor: o CNPq quer formar fundos financeiros patrimoniais a partir de captação de recursos por meio de doações filantrópicas e entregar esses recursos nas mãos de um gestor financeiro que investirá no mercado de capitais, revertendo os lucros ao financiamento (patrocínio talvez seria a melhor palavra) da ciência. Nesse tipo de fundo financeiro (endowment funds) apenas os rendimentos podem ser direcionados à finalidade pré-definida, isto é, trata-se de trabalhar para receber doações, depois escolher um bom gestor, um homem de sucesso, e que ele obtenha rendimentos no insano mercado de capitais nas inconstantes e imprevisíveis bolsas de valores.

A questão (e previsão) é simples. Imaginem parte da pesquisa brasileira dependente do sucesso de investimentos no mercado financeiro em 2008? Durante e depois da maior crise do capitalismo financeiro dos últimos tempos? Imagina a pesquisa nacional sujeitada a investimentos especulativos em títulos e ações que estão derretendo nas bolsas de todo o mundo atualmente? A possível dependência da ciência do capital financeiro, boa parte dele fictício, meramente especulativo, facilmente passível de fraudes e de crises, trará uma grande instabilidade não só das universidades e grupos de pesquisa, mas ao próprio CNPq.

O discurso e as propostas do órgão, bem como a maior parte das exposições na reunião, objeto desse relato e análise, estão afinadíssimos ao Future-se, essa estarrecedora política educacional confeccionada pelo MEC, já sob a direção do Ministro Abraham Weintraub. O Future-se, que o ministro chamou de “a maior revolução na área de ensino no país nos últimos 20 anos”, é nada mais, nada menos, do que a montagem para a destruição da universidade pública e gratuita como conhecemos até então, uma abertura a processos de privatização ou semiprivatização das instituições de ensino superior. Ataque à autonomia universitária, ataque ao caráter público da universidade, transformação da universidade em uma “indústria” produtora de mercadorias para o mercado, alienação do patrimônio da universidade a esse mercado e a criação de dependência ao mercado financeiro como forma de sustentação orçamentária da universidade são algumas das políticas públicas que até certo ponto já estão em execução nas universidades.

Finalmente, o presidente do CNPq anunciou a mudança “gradativa e contínua” no formato de distribuição de bolsas pelo órgão. Haverá um redirecionamento, sendo que a distribuição será por abertura de editais de pesquisa (é claro: em áreas prioritárias), praticamente extinguindo a distribuição de bolsas “por quotas” de programas de pós-graduação. As bolsas “por quota” existirão quase que unicamente para serem direcionadas a Programas em áreas estratégicas. Segundo a apresentação do presidente do CNPq, a transição dar-se-á da seguinte forma:

•Recolhimento contínuo das bolsas de mestrado e doutorado, de acordo com a conclusão do curso de cada pós-graduando, não habilitando a indicação de novos bolsistas nessas vagas, pelo respectivo PPG.

•Lançamento de Chamadas Públicas de Programas e Projetos de Pesquisa Científica, Tecnológica e de Inovação, seguindo as orientações temáticas estratégicas, bem como as diretrizes correntes do MCTIC para áreas prioritárias para o País

•Oferta de bolsas de mestrado e doutorado para a realização de Projetos de Pesquisa de interesse das ICTs subordinadas (Unidades Vinculadas) ao MCTIC, bem como a outras ICTs, públicas ou privadas, estabelecidas e priorizadas pelo MCTIC.

 

Em suma, caberá às áreas prioritárias disputarem, no já competitivo mundo dos recursos públicos para a ciência, as bolsas por projeto. As áreas e Programas não prioritários ficarão à deriva, podendo construir situações destrutivas, como, por exemplo: um programa avaliado com a nota 3 da Capes que tem sua área de pesquisa voltada a estudos sobre periferização urbana na América Latina, tema provavelmente muito distante do que o CNPq conceitua como área prioritária e que, consequentemente, não terá como concorrer nos editais. Resultado? Esse Programa recebendo menos ou nenhum recurso da Capes e órfão do CNPq e, seguramente, deixará de existir. Voltamos a pensar o caso das Ciências Humanas: se ela não é prioritária, não haverá editais; se não haverá editais, não haverá bolsas e nem fomento para a área de humanidades.

FINEP

O representante da Finep, enviado pelo seu presidente, General Waldemar Barroso Magno Neto (é bom repetir, a Finep é presidida por um General), apresentou duas direções ao órgão: cortes de orçamento, portanto deve-se trabalhar com o que tem, e abandono da convalida e cambaleante indústria nacional. As ações da Finep não levam em consideração o, talvez, maior processo de desindustrialização da era moderna entre os países industrializados, no qual o Brasil é protagonista. Por isso, o discurso foi de investimentos nas startups, em que o setor produtivo foi substituído pela busca de uma ideia genial e lucrativa. A própria natureza do conceito empresarial de startups é a de buscar uma ideia que dê lucro rodeado de aventura e incertezas. O mercado é quem dirá.

Dessa forma, a Finep prefere investir na esperança de que alguns afortunados tenham uma boa ideia, como por exemplo a invenção de um “app” (que por sinal, alguns deles já vem causando a mais dura exploração de trabalhadores), do que investir no setor produtivo, gerador de empregos, de mercadorias e de sua circulação.

MCTIC

O representante enviado pelo ex-astronauta e ministro Marcos Pontes, na sua breve apresentação, resumiu-se a quase pedir um grande obrigado das associações científicas ao Ministro na luta pela não extinção do CNPq. De fato, e tudo indica que foi verdade, o CNPq já estava sepultado pelo atual governo, seria aglutinado à Capes e deixaria de existir. No entanto, a atuação de Marcos Pontes na defesa da continuidade do CNPq parece ter sido fundamental.

Salvador do CNPq ou não, o MCTIC publicou a Portaria nº 1122, de 19 de março de 2020, com o objetivo de definir “as prioridades, no âmbito do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), no que se refere a projetos de pesquisa, de desenvolvimento de tecnologias e inovações, para o período 2020 a 2023”. Sem surpresas: o Ministério institucionalizou aquilo que já sabíamos, o fim dos recursos para as Ciências Humanas.


 

Consideração Final

A reunião entre SBPC/Sociedades e Associações Científicas e Governo foi um binóculo e um retrovisor para enxergarmos o que aconteceu na história recente, o que está acontecendo e o que acontecerá com o apoio e financiamento da ciência brasileira. As propostas e posicionamentos que vimos ali parecem estar em matrimônio com uma série de ações vindas dos porões de Brasília: proposta de extinção do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDTC): por determinação do Ministério da Economia, os recursos que iriam para esse fundo seriam usados para pagamento da dívida pública, ou seja, drenados para o capital financeiro especulativo e rentista; a Portaria 2227, de 31 de dezembro de 2019, que cercearia a liberdade de professores e pesquisadores de participar de congressos e eventos científicos; a MP 914 que dispõe sobre o fim da autonomia no processo de escolhas de reitores; e qualquer outra MP, Decreto, Portaria, Projeto de Lei que esse governo venha a manifestar, pois o objetivo é certo: destruir a ciência brasileira como ela era até pouco tempo atrás.

O que tudo indica, e bem parecido com empresas que lucram com catástrofes e tragédias sociais, o governo vai usar a pandemia do coronavírus para dilapidar as Ciências Humanas. A preocupação e medo que nos cria uma situação inédita no cotidiano da sociedade e de seu comportamento (quarentenada), com toda a mídia voltada a informar segundo a segundo os impactos e a luta contra o coronavírus, abriu um flanco para o Governo Bolsonaro emplacar e institucionalizar uma série de medidas que serão retrocessos históricos e civilizatórios. Dentre eles, a minimização (e se possível, extinção) das Ciências Humanas.


 

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (ANPEGE)

Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS)

Associação Nacional de História (ANPUH)

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística (ANPOLL)

Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (ANPEPP)

Associação Brasileira de Antropologia (ABA)

Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (ANPOF)

Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS)

Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP)